Eu sempre falo sobre o tarot, minhas consulentes, o simbolismo das cartas e diversos outros tópicos afins, tanto aqui quanto no resto da minha vida. É que ser cartomante é um traço da minha personalidade que eu valorizo muito e é algo tão presente no meu cotidiano que consigo relacionar temas místicos em praticamente qualquer assunto! Na edição de hoje, eu venho falar um pouco sobre como eu encontrei esse caminho e porquê é algo tão importante pra mim.
Tudo começou quando a minha mãe, uma pessoa iluminada e de muita fé, temendo pela minha alma insistiu repetidas vezes que eu precisava acreditar em algo, ter alguma religião (qualquer uma!) e um propósito. Eu, no auge da rebeldia com os meus 12 ou 13 anos, estava na minha fase cética/ateia/agnóstica. Quando eu era mais criança, ela me levava para acompanhá-la nos centros kardecistas que frequentava, mas quando eu quis parar e, por influência das minhas amigas de infância, teimei em fazer o catecismo ela respeitou a minha escolha. Enfim, ao terminar o curso, já não tinha mais certeza se acreditava em nada naquilo, ou em Deus de um modo geral.
Acontece que eu fiquei meio obcecada com os livros do Dan Brown naquela época, passava horas pesquisando sobre o tema, verificando e me aprofundando nas informações e histórias que ele contava nos suas obras e me enfiei em um misto de ceticismo e curiosidade. Foi meu primeiro contato com a história, as diversas filosofias e os princípios do paganismo.
Quando comecei a me afastar da igreja católica, minha mãe tornou a insistir que eu buscasse uma fé, qualquer que fosse. Naquela época, meados de 2014, estava começando a pipocar aqui no Brasil a “febre” da Wicca. Eu, contraventora como era, pensei: “Vou praticar bruxaria”.
Direcionei minhas pesquisas sobre simbolismo e história da arte para a história e conhecimentos Wiccanos, mas, como nesse esquema de pirâmide que é o esoterismo tudo é conectado à alguma outra coisa, a Wicca foi só a boca do funil pra mim. Eu me envolvi profundamente naquilo, encontrei sentido em muitas das correntes que descobri: conheci o Satanismo LaVey, conheci Crowley e a Golden Dawn, o hermetismo e a Kabbalah Hermética, a Magia do Caos, bruxaria celta, o Grande Oriente e várias outras escolas, até que, por fim, conheci o tarot (na verdade, talvez o tarot tenha vindo no meio disso tudo). Lembro de um pequeno manifesto que eu escrevi sobre consciência, liberdade, bruxaria e autonomia na época, muito provavelmente ele se perdeu no tempo entre os meus muitos diários e cadernos de histórias (nessa idade eu já era dada à escrita).
Em meio à essas pesquisas e leituras, eu buscava tirar minhas dúvidas em grupos de Facebook e outros fóruns online com pessoas que já tinham uma prática mais avançada. Num desses, li que toda bruxa deveria saber ler o tarot ou algum tipo de oráculo, que era bom para saber a melhor hora para um ritual e conferir o andamento do mesmo, entre outras coisas que demandavam uma comunicação mais direta com a espiritualidade.
Minha tia vendia Avon pela revista e um dia na Avon Moda & Casa (uma revista secundária que vendia livros, coisinhas para casa e decoração, roupas, etc) eu vi à venda o seguinte livro:
Eu não tenho ideia de como eu sempre tinha um dinheirinho pra juntar, acho que eu deixava de comprar lanche na escola para poupar e comprar os livros que eu queria. Fiz uma boa parte da minha coleção assim, aproveitando as promoções dos falecidos Submarino, Fnac e Saraiva, além das revistas Moda & Casa da minha tia. Enfim, juntei o dinheiro e encomendei o livro. Ele vinha com um destaque nas páginas finais para recortar as cartas de tarot (não estou lembrada se era o baralho completo ou só os arcanos maiores).
O livro chegou e eu estudei as cartas principais por algum tempo, em paralelo com outros assuntos relacionados ao oculto, mas acabei me descomprometendo com o estudo das cartas por um período. Mergulhei em outros tópicos, principalmente astrologia e algumas mitologias, simplesmente porque começaram a me chamar mais atenção. Posteriormente, esse conhecimento veio a ser bem útil e complementar as minhas leituras de tarot.
Nesse ponto, eu já estava frequentando o ensino médio e foi só quando ele terminou que, graças a dois encontros fortuitos e isolados, eu me reconectei com a cartomancia.
Encontro 1: Frequentei por alguns meses um terreiro de umbanda acompanhada do meu tio. Me envolvi bastante com a espiritualidade ali, mas ainda nas amarras dos dogmas religiosos, coisa que nunca gostei. Numa festa linda de ciganos que eu fui, a cigana Esmeralda tirou as cartas pra mim e eu senti algo ali se acender em mim, fiquei encantada com ela lendo a minha sorte, lembrei do meu tosco primeiro baralho que já tinha ido parar no lixo há muitos anos e me senti um pouco enlutada pelo tempo que perdi quando podia estar aprendendo a ler tarot.
Encontro 2: Existiu – ou ainda existe? – um grupo no Facebook sobre Clientes que não têm razão, onde profissionais do atendimento ao público (CLTs, PJs, vendedores e prestadores de serviço no geral) iam contar causos, absurdos e situações engraçadas do trabalho com o público. Pipocavam no grupo relatos de cartomantes falando sobre clientes folgados e sem noção, alguns meio tristes, outros bizarros, outros engraçados. Aquela luzinha voltava a se acender em mim toda vez que eu lia essas histórias e comecei a me imaginar nessa posição. Foi aí que me toquei que era perfeitamente possível eu me tornar cartomante.
Voltei aos velhos estudos de ocultismo, busquei cursos e aulas online (não fiz nenhum), mas fui atrás de livros, baixei e li dezenas de PDFs sobre a história e os significados das cartas, fiz cadernos de anotações e, depois de alguns meses, me senti pronta para comprar o meu primeiro deck, que foi esse aqui:
O Tarot das Bruxas da Ellen Dugan. Não sei ao certo porquê escolhi esse. As cartas pareciam falar comigo, os seus desenhos eram claros, mas obscuros ao mesmo tempo, a carta do Ás de Copas prendeu minha atenção de um jeito que não me esqueço até hoje.
Comecei jogando para amigos e família, quase sempre acompanhada do livro de significado das cartas e das minhas anotações. Fui aprendendo métodos diferentes, ganhando confiança e largando o apoio dos livros. Comecei a falar para mais pessoas que eu jogava e que queria praticar, oferecendo jogos gratuitos. Um dia uma conhecida do trabalho me perguntou quanto eu cobrava para jogar e eu nunca tinha cobrado nada de ninguém, mas agora que tinham me perguntado a respeito, esse caminho de repente parecia uma possibilidade. Foi a primeira vez que alguém me viu como profissional.
Isso aconteceu na segunda metade de 2020. Ao final daquele mesmo ano eu criei a minha página no Instagram e comecei a oferecer meus serviços ao público cobrando devidamente por eles.
Eu sempre faço referências ao tarot nos meus textos e poemas, pois há muita sabedoria oculta nas lâminas, ensinamentos incríveis a serem extraídos. Mas é principalmente o atendimento, a troca com outras pessoas que me agrega muita coisa. Pode-se dizer que eu aprendo bastante com os erros dos outros.
Por vezes alguma consulente chega com perguntas que me intrigam, ou com questões simples cuja resposta das cartas e os conselhos que o baralho oferece que me fascinam, me deixam pensando por dias, alugam um triplex na minha cabeça. As vezes enxergo algumas verdades tão fundamentais e óbvias que fico com vontade de contar para o mundo todo. Eu sou muito sortuda de poder ser receptáculo e canal de tantas histórias, eventos e aprendizados na vida de algumas pessoas.
Uma coisa que eu não faço com frequência é tirar as cartas para mim mesma ou me consultar com outros cartomantes. Eu já sou uma pessoa neurótica e ansiosa o suficiente por natureza e sinto que tem coisas que eu não preciso saber. Um dos maiores conhecimentos que o tarot me trouxe é que a ignorância é uma benção.
Bem no início da minha trajetória como cartomante, antes de me sentir confortável em abrir o baralho para outras pessoas, eu era a minha principal consulente. Já estive em situações que previ para mim mesma, mas não quis acreditar, fazendo uma interpretação super tendenciosa para o que eu queria ver (ou não queria ver nesse caso). Mesmo com o contexto sendo gritantemente óbvio. Quando eu finalmente estava ali no meio dos acontecimentos que eu vi chegar, entendi que se for pra saber das coisas e não fazer nada, é melhor não saber. Se for para se torturar com o que você encontrou, é melhor não procurar nada.
Por vezes eu busco orientação espiritual ou faço perguntas mais gerais sobre a minha vida. Temas sensíveis que são muito urgentes e eu sinto que realmente demandam uma leitura, geralmente peço para alguma amiga taróloga ou outra cartomante de confiança ver para mim, mas é bem raro.
No entanto, mesmo sem procurar, algumas mensagens me encontram as vezes. A conexão cósmica é um canal que quando a gente abra, a gente ABRE, entende? E nem estou falando no sentido de ser uma convocação divina ou um chamado da espiritualidade, é mais sobre ser cada vez mais sensível aos sinais que nos cercam o tempo todo. No geral, não estamos aptos a reconhece-los, mas estão lá. Saber ler o mundo para além do que é perceptível aos sentidos do corpo é um caminho sem volta, algo que não se desliga. Eu adoro essa parte de mim e a cultivo com muito carinho. Tenho, inclusive, um causo muito curioso a respeito dessas “mensagens” que me encontram mesmo que eu não as procure, mas isso é história para outra edição.
Das poucas coisas que eu tenho certeza nessa vida, uma delas é que eu iria encontrar o caminho dos oráculos mais cedo ou mais tarde. É algo com o qual eu me sinto intimamente ligada e constitui uma parte essencial de quem eu sou, das minhas referências e dos meus ideais. O tarot e o ocultismo acabaram se tornando algo significativo e integralmente parte de mim. É o meu jeitinho, sempre ter um paralelo místico para traçar em qualquer conversa ⋆⁺‧₊☽◯☾₊‧⁺⋆
💡 Hints da vez:
📚 Uma das minhas cartomantes favoritas da ficção é a Pilar Ternera, de Cem anos de solidão, o grande clássico de realismo fantástico do Gabriel Garcia Marquez. A leitura é incrível e a série da Netflix está valendo muito a pena. Recomendo!
🎶 Greentea Peng é britânica e, segundo ela mesma, canta R&B psicodélico. Suas músicas são gostosas de ouvir, tranquilas e ritmadas, com um grave envolvente e uma potência vocal absurda! Recomendo ouvir A Color Show de Downers e o disco Man Made (esse é uma experiência!). Escrevi essa edição ouvindo ela.
💭 Nos vemos na próxima edição! Até lá, me conte tudo que você pensa:
Ler esse texto me deu um aliviozinho de que tudo bem ter livro sobre o significado das cartas em uma tiragem quando se é iniciante. Não é a algo que curto tanto fazer, de sempre me apoiar em um livreto; é como se eu não soubesse interpretar o suficiente as cartas.
Mas sinto essa conexão com o tarot desde muito antes quando foi um assunto de pesquisa para uma de minhas histórias, e depois de alguns anos comprar um deck e sentir o peso dele é um momento que nunca tive com qualquer outra coisa no caminho espiritual.
Amei demais o texto 🥰🥰🥰